No início de 2023, Nicko McBrain, baterista da banda de heavy metal Iron Maiden, sofreu um AVC que o impossibilitou de exercer suas atividades musicais no mesmo nível de antes. Agora, no final de 2024, ele anuncia sua aposentadoria. Seu último show com a banda foi no Brasil. O que talvez você não saiba é que Nicko se converteu à fé cristã em 1999, influenciado por sua esposa, Rebecca.
Mas por que, sendo um cristão confesso desde 1999, ele só agora decidiu sair da banda Iron Maiden? Parte da resposta já foi dada no primeiro parágrafo: ele está se aposentando porque sua condição física não permite mais acompanhar o ritmo exigido pela banda.
Nossa cultura evangélica moderna, frequentemente dicotômica, tende a separar a arte — especialmente a música — entre “santa” e “profana”, ou seja, entre música “do mundo” e música “de Deus”. Em termos técnicos, música secular e música gospel. Para muitos cristãos que adotam essa visão, é errado ouvir música “do mundo” e, pior ainda, inadmissível que um cristão seja músico em uma banda secular.
De fato, há músicas e até bandas cujas mensagens não são saudáveis para um cristão ouvir, muito menos integrar como músico. Letras que exaltam o pecado, ofendem a fé ou usam termos desrespeitosos em relação a Deus devem ser rejeitadas pelos cristãos. No entanto, é preciso maturidade para reconhecer que nem toda música secular é ruim, assim como nem toda música gospel é boa.
O evangelicalismo brasileiro, em sua maioria, promoveu essa visão dicotômica, o que levou alguns artistas seculares, após sua conversão, a se tornarem cantores gospel quase que por obrigação. Essa transição, porém, nem sempre foi bem-sucedida. Um exemplo clássico é o constrangedor disco gospel de Gretchen. Embora eu não queira questionar a sinceridade da conversão da cantora, o álbum Jesus Dance, lançado em 1996, é lamentável. O “hit” Jesus é Rei, uma paródia do Melô do Piripipi, é particularmente vergonhoso.
Voltando a Nicko, ele continuou a tocar no Iron Maiden mesmo após sua conversão, e seu testemunho durante esse período foi admirável. Os integrantes da banda relataram que ele se tornou uma pessoa melhor, e Nicko passou a frequentar regularmente uma igreja local. Entendo que alguns cristãos possam achar estranho que ele tenha permanecido na banda, especialmente devido aos estereótipos associados ao Iron Maiden, muitos deles criados pelos fãs.
No entanto, em meu ponto de vista, a banda não se enquadra no tipo de grupo que um cristão deveria evitar por princípio. O único motivo legítimo para alguém não gostar da banda seria preferência pessoal — “não gosto de heavy metal” —, o que é perfeitamente compreensível. Pessoalmente, aprecio a banda. Suas músicas abordam temas como a história da Inglaterra, mitologias (especialmente as inglesas) e até textos bíblicos. Um exemplo é a polêmica música The Number of the Beast, além dela temos uma forte influência bíblica na música Revelations, do álbum Piece of Mind.
Nicko foi um baterista cristão em uma banda secular. Quando alguém se converte ao cristianismo, se seu trabalho não é moralmente errado, não há necessidade de abandonar o emprego. Pelo contrário, ele deve ser luz no ambiente em que trabalha. Se, no entanto, o emprego envolve práticas incompatíveis com a fé, como um advogado em uma companhia corrupta, o cristão deve, sim, deixar o trabalho.
O mesmo princípio se aplica a músicos. Se o ambiente for inadequado, é necessário buscar outro lugar. Mas, se não for o caso, o cristão pode continuar onde está, sendo testemunha de sua fé, como Nicko McBrain foi no Iron Maiden.
Meu objetivo com este texto não é fazer você gostar de Iron Maiden. Quero apenas que reconheça que havia na banda um irmão genuíno, membro da Igreja de Cristo.
“O pastor, então, deu início ao sermão. Basicamente, ele disse que, onde quer que estivéssemos, deveríamos pedir por Deus em nossa vida. Pedir por Jesus Cristo, dar o coração a Ele. Fiquei lá de olhos fechados. Juro que Deus e Jesus me puxaram, e eu segui em frente como se estivesse sendo levado. Não conseguia sentir mais nada. Senti a presença de Deus. Dei meu coração a Deus e pedi por Jesus em minha vida” — relato de Nicko McBrain sobre sua conversão.
Muito boa a redação! É importantíssimo demonstrar que a demonização das músicas criadas por artistas fora dos púlpitos de ouro, às vezes, nos atrai mais para Deus do que as músicas feitas pelos pseudo-cristãos!
Tenho 18 anos que acompanho a banda e fiquei mto feliz qdo soube dessa história do Niko. Penso da mesma forma pessoalmente. Em fim, ótimo artigo que dismifica mta coisa… um abraço!